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quinta-feira, 16 de julho de 2015

Pequenas Histórias


Pequenas Histórias (88) – Ano – 1973

Enfrentando o prezado amigo Afonsinho

Loivo - Afonsinho

Alcei voo próprio lá pela metade dos anos 80, quando saí de casa; antes, vivi as várias etapas da minha vida na Bento, entre livros, muitas aulas, reuniões dançantes, bolas, jogos de botão e o carinho da minha família.

Nos times de botão, neles, havia o Botafogo, entre os onze, o goleiro Cao e os meios-de-campo Carlos Roberto e Nei (Conceição). Esses botões vinham com a cara de cada jogador.

A Bento começa na Benjamin e nela, justamente na “boca” da minha rua, morava o Ernani, que também tinha o Botafogo, mas com o goleiro Manga e os meios-de-campo Gérson e Afonsinho. Os demais eram os mesmos da minha versão.

Essa pequena diferença era colossal; Manga, o melhor arqueiro do mundo, não é à toa que a sua data de aniversário, 26 de Abril, virou o dia do goleiro, Gérson era gênio, maior nome da final da Copa de 70 e Afonsinho. Este último, uma das mais importantes personalidades da história do futebol brasileiro, talvez do mundo. Atuou também, ao lado de Garrincha, Pelé, Zico, Jairzinho e Roberto Dinamite, entre tantas outras estrelas.

Afonsinho, paulista, chegou para o Botafogo na metade dos 60, jogando, iniciou e concluiu o curso de Medicina. Tinha um futebol refinado de grande técnica, um craque, no entanto, por ser um atleta com uma consciência social acima da média, um socialista na prática, por usar barbas e cabelos longos, entrou em choque com a direção alvinegra, cuja cartilha rezava pelos mesmos preceitos dos ditadores da Nação. Foi encostado, proibido de atuar. A justificativa era a barba e os cabelos, que o atleta se negava a aparar.

Afonsinho lutou e ganhou. Tornou-se o primeiro jogador de futebol a ter o passe livre concedido pela justiça. Depois, sempre com o passe na mão, alugou para Olaria, Santos, Flamengo, Vasco e Fluminense. Além disso, inspirou Gilberto Gil, o baiano produziu uma música que virou um clássico; chama-se Meio de Campo, que também foi gravada por Elis Regina e começa assim: “Prezado amigo Afonsinho, eu continuo aqui mesmo, aperfeiçoando o imperfeito, dando um tempo, dando um jeito, desprezando a perfeição, que a perfeição é uma meta defendida pelo goleiro, que joga na Seleção ...”.

Atualmente, ele está aposentado,  mas segue exercendo a Medicina voluntariamente no Rio de Janeiro e tem uma coluna na revista Carta Capital. Herdou o posto, depois da morte de Sócrates, outro craque da medicina e dos gramados.

Afonsinho enfrentou várias vezes o Imortal, uma delas jogando pelo Flamengo no Maracanã pelo Brasileiro, num Sábado, dia 27 de outubro de 73. Foi uma das maiores vitórias do Tricolor naquele ano. 2 a 1, de virada.

Com Oscar Scolfaro no apito, público de 31 mil pessoas, o Grêmio utilizou: Picasso, Cláudio Radar, Ancheta, Beto Bacamarte e Everaldo (Jorge Tabajara); Carlos Alberto e Paulo Sérgio (Yúra); Carlinhos, Mazinho, Tarciso e Loivo.

O Flamengo de Zagallo: Ubirajara Mota; Moreira, Rondinelli, Tinho e Rodrigues Neto; Liminha, Afonsinho e Zico; Rogério, Dario e Paulo César Lima, o Caju. Resumindo: um cano de time, mas mal treinado, pois chegava para o confronto com quatro derrotas seguidas. Aumentaria essa desagradável estatística naquela tarde.

Com uma atuação comprometedora de Paulo Cesar, que discutiu muito com os colegas na segunda fase, quando apresentou pouco empenho, o Mengo, ainda assim, esteve bem no primeiro tempo, vencendo com gol de Dario, o Dadá Maravilha, aos 31 minutos, aparando uma cobrança de corner (escanteio). Ele empurrou com o joelho a pelota para o fundo das redes; antes, o centroavante perdera inúmeras chances diante de Picasso como aos 34 minutos, quando Afonsinho driblou Carlos Alberto, Ancheta e Beto, pifando o Peito-de-Aço, que chutou sobre o arco.

No retorno do intervalo, o Tricolor evitou a armadilha de ser pego em vários impedimentos, seu maior erro nos primeiros 45 minutos. Aos 25, Carlos Alberto colocou Yúra frente a frente com Ubirajara. Rondinelli e Tinho “ensanduicharam” o meia; pênalti. Tarciso cobrou com a até então, infalível precisão e empatou. 1 a 1.

O rubro-negro carioca se descontrolou e o Imortal tomou conta da partida. Aos 40 minutos, da intermediária, Loivo cuja a especialidade eram o grande fôlego e cobranças de faltas precisas, num tiro longo, decretou a vitória gremista.

Naquele ano, o time treinado por Carlos Froner fez excelente campanha, onde obteve percentual de pontos apenas inferior ao campeão, Palmeiras. Foram grandes jornadas. Este Flamengo 1 x 2 Grêmio foi apenas mais uma.

Nesta crônica, contei com o habitual apoio “logístico” do amigo Alvirubro a quem agradeço.

É uma modesta homenagem ao cidadão brasileiro, Afonso Celso Garcia Reis, o Afonsinho.

Mais sobre ele, poderá ser visto em Prezado Amigo Afonsinho, obra de Kléber Mazziero de Souza, Método Editora, 1998 e no documentário Passe Livre de Oswaldo Caldeira, produção de 1974.



3 comentários:

  1. Eis que encontro mais um leitor da Carta!? rs

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  2. PJ
    Mino Carta está entre os maiores jornalistas de todos os tempos.

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