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quinta-feira, 12 de junho de 2014

Na Copa



UMA CONQUISTA MAGISTRAL

6 de junho de 1938  - França

Antes da partida, o Brasil perdeu o sorteio para definir a cor do uniforme, já que, assim como a Polônia, usava camisetas brancas. Acabou entrando em campo com uma camiseta azul, e sem o distintivo, e com um calção azul. Só que futebolisticamente, tudo foi diferente.

Raras vezes o público teve oportunidade de presenciar uma atuação como fez Leônidas, que parecia estar “endiabrado”. Com certeza, nunca tinham visto um jogador com tamanha habilidade e agilidade. Aos 18 minutos, foi de Leônidas o primeiro gol do jogo: combinando com Perácio, Romeu Pelliciari entregou a Leônidas que avançou, mandando violento chute em direção ao gol. O “keeper” polonês não conseguiu defender. Brasil 1x0! A torcida aplaudiu freneticamente o atacante brasileiro.

O único gol polonês, no primeiro tempo, só surgiu porque numa investida do ataque adversário, Gerard Wodarz agarrou, na área, Domingos da Guia. O árbitro interpretou a falta de forma equivocada e marcou pênalti para a Polônia. Apesar da reclamação de milhares de torcedores, Fryderyk Scherfke converteu em gol a cobrança, aos 23 minutos.

Tão logo teve reinício a partida, aos 25 minutos, Romeu Pelliciari colocou o Brasil na frente do placar. 2x1! E aos 44 minutos, após uma jogada fulminante da linha de atacantes brasileira, Perácio recebendo a bola de Martim Silveira, de cabeça, fez o terceiro gol para a nossa Seleção. Final 3x1! No 1º tempo, os brasileiros dominaram nitidamente a partida, fazendo um jogo matemático e preciso, cheio de jogadas envolventes, em todos os setores do campo.

Boquiabertos, os torcedores europeus viram um futebol que nenhuma seleção havia praticado até então, tal foi a qualidade apresentada nas jogadas criadas. Não fosse o excesso de preciosismo dos atacantes, a equipe brasileira poderia ter marcado bem mais que os 3 gols alcançados na primeira etapa.

Debaixo de uma chuva torrencial, teve início a segunda etapa de jogo. Devido ao péssimo estado em que se encontrava o gramado, a partida decaiu de qualidade em todos os seus aspectos, quer em relação à parte técnica, quer em relação ao entusiasmo dos atletas. Os defensores brasileiros passaram a errar em demasia e a Polônia cresceu no jogo. Arthur Machado, zagueiro brasileiro, parecia descontrolado. Aos 8 minutos, Ernest Wilimowski chuta. A bola desvia em Machado e vai para o fundo do gol. Placar de 3x2 para o Brasil!

Aos 14 minutos, depois de uma falta praticada por Leônidas no ataque brasileiro, a bola é lançada para Ernest Wilimowski, que escapa, ao driblar Domingos da Guia, e empata a partida com um violento tiro, que Batatais não consegue alcançar. 3x3!

Aos 26 minutos é assinalado um "corner" contra o Brasil. Batido o escanteio a bola “voa” para a área e Domingos da Guia salva. Lopes escapa e passa a Leônidas. Este dá a Perácio que passa a Romeu Pelliciari. Ambos investem. Perácio entra e chuta violentamente de uma distância de 35 metros, batendo o goleiro Edward Madejski. A assistência aplaudiu entusiasticamente o feito do jogador brasileiro, que deu um incrível “pelotaço”. Brasil 4x3 Polônia!

Nova saída de bola do centro do gramado e Leônidas toma a bola e vai ao ataque. Troca passes com um atacante brasileiro e adentra a grande área. É derrubado e o árbitro não marca a penalidade máxima. Em meio aos torcedores, inúmeros sul-americanos reclamam e passam a gritar repetidas vezes: Brasil! Brasil! Brasil!

A Polônia passa a jogar com violência e o árbitro não coíbe o jogo faltoso. Leônidas é segurado novamente dentro da área, pela camiseta. O árbitro manda seguir a jogada. As oportunidades criadas pelo time do Brasil vão se acumulando e nada de surgir o gol. Numa perigosa investida dos poloneses, Batatais choca-se contra trave, tentando defender um forte chute adversário. A Polônia pressiona mais e mais. Batatais passa a praticar defesas espetaculares. O jogo atinge os minutos finais. Perácio pressiona o árbitro pedindo o término da partida. A Polônia vai ao ataque, aos 44 minutos, e Ernest Wilimowski, chutando a gol, numa última tentativa de igualar o marcador, vê a bola passar debaixo do corpo do goleiro brasileiro. 4x4! A prorrogação estava à caminho.

Na saída de bola, via-se nitidamente o nervosismo dos jogadores brasileiros. Aos 3 minutos, Hércules de posse da bola, encontra Leônidas bem colocado. Com um belo jogo de corpo, o atacante dribla dois adversários, investe e chuta para marcar o quinto gol para o Brasil. Calorosamente, vibram e aclamam os torcedores. Brasil 5x4!

Os jogadores brasileiros souberam reagir com muito entusiasmo e exerciam o controle pleno da partida. Entretanto, continuavam perdendo chances de aumentar o placar. Somente aos 14 minutos, Leônidas, numa violenta rebatida, de pé esquerdo, marca o último gol do Brasil. 6x4! O árbitro não percebeu que, após um chute, Leônidas havia perdido a chuteira. No rebote, mesmo descalço, marcou o gol.

A descrição da jogada feita pelo jornalista Geraldo Romualdo da Silva é encantadora:
“No primeiro arremesso, o campo encharcado, a bola saiu junto com a chuteira. E rolou, meio morta, nas mãos tentaculares de Madejski. Era de não se esperar mais nada. Madejski no entanto escorregou no tiro de meta. A bola subiu, subiu e caiu bem na frente de Leônidas. Numa fração de minuto, Leônidas se pôs de pé, e assim mesmo, na posição incômoda que se encontrava, não vacilou e emendou, direto, um sem-pulo seco e definitivo: rede. A batida, forte e inesperada, apanhou o pequeno estádio da cidade de Estrasburgo de boca aberta. Foi um estremecimento geral. Os comentaristas esportivos da Europa, que supunham ter visto tudo dentro das quatro linhas de um campo de futebol, reagiram com espanto, perplexidade e gritos de Bravo! Bravo! Bravo!”

O primeiro tempo da prorrogação termina e as equipes trocam de lado. Dada a nova saída, o Brasil passa a se defender. A Polônia teria ainda tempo para marcar o quinto gol, por intermédio de Ernest Wilimowski. Final de jogo: Brasil 6x5 Polônia. Após a vitória, os jogadores carregaram Leônidas em triunfo para fora do campo, aplaudidos pela grande assistência.

A Seleção teve 8 escanteios a seu favor, contra 12 dos poloneses. Cometeu 13 faltas e os adversários 23. Batatais defendeu 18 chutes e o goleiro polonês interveio em 20 oportunidades.
Leônidas da Silva foi, sem dúvidas, o grande destaque da partida entre BRASIL e POLÔNIA. 

Entretanto, Perácio, o “Pequeno Terrível”, assim chamado pelos torcedores que viram a partida, em Estrasburgo, também merece receber os “louros da vitória”, tamanha foi a sua atuação.

Cabe destacar que foi o jornalista francês Raymond Thourmagem, da revista Paris Match, quem apelidou Leônidas de "Diamante Negro". O jornalista ficou maravilhado pela habilidade do jogador brasileiro. A empresa Lacta acabou homenageando o jogador, criando o chocolate "Diamante Negro". Noticia-se que Leônidas nunca cobrou nada pelo uso da marca. Porém, segundo confirmou a própria Lacta, o valor do contrato foi de 2 contos de réis, além de uma participação nas "vendas futuras".

A descrição da importância de Leônidas da Silva, nos minutos finais da partida contra a Polônia, feita pelo jornalista Thomas Mazzoni, que cobria a Copa pelo jornal A Gazeta, é memorável:
"Simplesmente assombroso. Foi a ponta de dinamite do nosso quadro. Em improvisação, Leônidas fez o impossível. Cada lance do avante flamenguista era uma corrente elétrica de entusiasmo na multidão! Arte de bruxaria (...) E Leônidas – vejam mais esta – era guardado por três policiais poloneses, que o tratavam sem cerimônia, recebendo, porém sempre com o troco (...) Sim: Leônidas desafiava os antagonistas no jogo agressivo! O “negrinho”, sem poupar coragem, andou “pisando”, para impor respeito (...) Tantas vezes o aterraram, tantas vezes se levantou”.

BRASIL 6x5 POLÔNIA
Data - 5 / 6 / 1938
Árbitro - Ivan Eklind (Suécia)
Local - Estádio de La Meinau - Strasbourg (França)
Público - 13.452
Gols - Leônidas da Silva 18', Friedryk Szerfke (pênalti) 23', Romeu Pelliciari 25', Perácio 44' do 1º tempo; Ernest Wilimowski 8', Ernest Wilimowski 14', Perácio 26', Ernest Wilimowski 34' do 2º tempo; Leônidas da Silva 3', Leônidas da Silva 14' do 1º tempo da prorrogação; Ernest Wilimowski 13' do 2º tempo da prorrogação
BRASIL - Batatais, Domingos da Guia, Arthur Machado, Zezé Procópio, Martim Silveira, Affonsinho, José dos Santos Lopes, Romeu Pelliciari, Leônidas da Silva, Perácio, Hércules. Técnico - Adhemar Pimenta

POLÔNIA - Edward Madejski, Wladyslaw Szczepaniak, Antoni Galecki, Wihelm Góra, Erwin Nyc, Ewald Dytko, Ryszard Piec, Leonard Piatek, Fryedryk Scherfke, Ernest Wilimowski, Gerard Wodarz. Técnico - Józef Kaluza

por Alvirubro

4 comentários:

  1. Paulo Juliano12/06/2014, 11:46

    Emocionante.

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  2. O mesmo jornalista francês, também apelidou Leônidas de "Homem-Borracha".
    Jogou a Copa de 34 na Itália e se consagrou nesta, pena que não pode jogar as outras duas seguintes, 42 e 46.
    Tenho a biografia dele, seguramente, foi o primeiro super-craque que tivemos, embora houvesse nessa época, Domingos da Guia e antes, Friedenreich.

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  3. Bruxo, sobre Leônidas da Silva, é impossível descrever tudo aquilo que ele merece, em apenas uma página. Não foi em vão que surgiu "Diamante Negro", de André Ribeiro. Vale à pena.

    Leônidas da Silva, "cracaço" do futebol mundial, morreu em janeiro de 2004, aos 90 anos, muito debilitado pelo Mal de Alzheimer.

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  4. Alvirubro!
    Como costumo deixar anotado no livro a data que li, digo, Março de 1999 a obra do André.

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