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terça-feira, 1 de agosto de 2017

Opinião



Hélio Dourado, o Libertador

Morreu o patrono gremista; isto, por si só, demonstra a estatura do gremista que nos deixou hoje, 1º de Agosto.

Hélio Dourado foi um dos maiores médicos gaúchos, um cirurgião renomado, porém, a maior lembrança será sempre a do gremista empreendedor, arrojado, inconformado com eventuais fracassos, um bravo que defendeu o Imortal em todas as situações que presenciei.

Para quem foi adolescente nos anos 70, que sofreu com oito anos consecutivos de títulos regionais e os dois primeiros Brasileiros do Internacional, isto é, o meu caso; esta turma, por certo não achará a minha comparação desmedida: Dourado foi o nosso Moisés a nos libertar do cativeiro das derrotas e nos conduzir à Terra Prometida, ou seja, a volta da rotina de títulos. Como o personagem bíblico, Hélio Dourado também era humilde para a dimensão que possuía no cenário do futebol do RS. O patrono cruzou o Mar Vermelho.

Para exemplificar; eu consegui o número de seu celular e liguei duas vezes em diferentes datas para conferir a história que indicava ter ele jogado no Grêmio na década de 40. Ele me tratou como se me conhecesse há anos, conversou bastante, me deu seu endereço, ali no bairro Moinhos de Vento, disse para eu passar lá que ele iria detalhar a história. Assim! Eu, um amador, um torcedor anônimo, acertando uma visita com um dos maiores ídolos da minha geração. Deixei passar a oportunidade, infelizmente.

Se o Grêmio é clube mundialmente conhecido, muito deve a capacidade gestora de Hélio Dourado, a sua clarividência e capacidade de mobilização. Ele trouxe Ortiz, ponta da Seleção Argentina, Paulo Cesar Lima (Caju), algo que a gente se belisca até hoje para acreditar que o polêmico craque deixou Leblon e Ipanema para enfrentar o frio glacial de Bento Gonçalves, Passo Fundo e Bagé naquele 1979 de inverno rigoroso. Mais! Trouxe Émerson Leão, goleiro da Seleção Brasileira, Nelinho, Vantuir, o paraguaio Kiese (que não deu certo) e De Leon, que chegou dizendo que o Tricolor seria campeão brasileiro naquele ano. De Leon era Dourado dentro das quatro linhas. Um espírito vencedor.

Antes, Dourado buscou outro ícone do futebol brasileiro: Telê Santana, que promoveu uma revolução no estado ao reverter a gangorra do futebol do Sul. 

Hélio Dourado trouxe outro treinador caríssimo, Orlando Fantoni que ganhou um regional com mais de 10 pontos de vantagem sobre o Coirmão, justamente em 1979.

Em 1980 fez o impensável; dispensou o treinador campeão (Paulinho Almeida) e contratou o que perdeu em casa, conduzindo o principal rival. Assim, Ênio Andrade trocou de endereço profissional no ano seguinte. Ano do primeiro campeonato nacional, 1981.

O patrono também encarava as paradas tortas como a de peitar Felipe Melo no vestiário no malfadado ano de 2004. Não era de recuar diante de cara feia.

Também teve coragem suficiente para aceitar num período de muito preconceito, a primeira torcida gay do Brasil; a Coligay.

A campanha de arrecadação de tijolos para a conclusão do Olímpico, ele próprio se encarregou de capitanear a empreitada e saiu rincões afora, contagiando a massa e o nosso estádio teve até camarotes, uma novidade à época.

Esta é uma pequena parcela da sua biografia, a parte que conheço e sei que é ínfima perto dos que conviveram com essa gigantesca figura Tricolor.

Muito ainda será revelado, mas os números apresentados pelo amigo Alvirubro na postagem anterior é um belo começo.

4 comentários:

  1. Penso muito no Grêmio politicamente também, e me preocupa isso muitas vezes, quase sempre. Espero, torço, que o Grêmio saiba se renovar, ou redescubra como se renovar, e quebrem no conselho o apelido (justo) de "conselho decorativo". Que apareçam lá gente não só porque o pai ou o avô estavam lá e por isso ele/ela "deve" estar, por tradição hereditária, ainda que mal liguem para o clube, ainda mais em se esforçar por ele, mesmo podendo, se aproveitando apenas para acessar vestiário com filhos para tirar selfies com ídolos. Ou tenha "fome" ou cedam lugar, que entrem no clube para arregaçar as mangas ou cedam o lugar. Que fiquem lá porque estão a fim de realmente empreender, que fiquem o tempo todo verificando o clube de alto a baixo e bolando ideias para apresentar em reuniões, para colocar aos presidentes, isso não os tira da situação ou oposição, mas infelizmente o política no futebol está de tal maneira que uma boa ideia pode ser escondida para não dar armas ao rival político.

    Dourado, é certo, não tinha mais como contribuir com o Grêmio exceto por sua história, e a verdadeira dor está em sua família e amigos próximos. Mas este era um gremista dos bons, que tem faltado no Grêmio: ambicioso, empreendedor, nunca acomodado. (E não pipocava: foi o único contra a aclamação de Obino, um zero executivo, mas foi ajudá-lo, dentro de suas possibilidades, já debilitado, quando chamado não sumiu, foi tentar resgatar o Grêmio da lama.) Ele gostava do Grêmio que ele vivia, mas queria mais, dentro e fora de campo, time e estrutura, títulos e clube. Espero que o exemplo que ele deu não seja "cremado". O Grêmio, por mais que estejamos mais satisfeitos ou menos satisfeitos, precisa sempre ser mais, sempre precisa ser mais do que é, mais do que os outros, como um tubarão que sempre precisa nadar para não afundar, como um caça que precisa sempre de alta velocidade para não cair como uma pedra por não planar. Sempre crescer, sempre inovar, dentro e fora de campo. Não vejo essa ânsia, essa coisa de mergulhar de cabeça, hoje em dia, virou algo ingênuo, algo inocente, algo romântico. E os que fugiam à regra, os "loucos" visionários e idealistas vão envelhecendo e morrendo.

    Hoje em dia, a maioria dos conselheiros e dirigentes são figuras passivas, e todo trabalho se concentra em quem está no poder no momento, o resto fica como a nobreza francesa pré revolução, se aliena alegremente. É difícil a ambição surgir numa instituição essencialmente amadora e não lucrativa, mesmo porque o mundo do futebol ficou imenso, e contra essa dificuldade se deve lutar - quem tem coragem? A inconformidade e a ambição (mesmo na boa situação, porque na ruim é fácil se inconformar ainda que não se faça nada) não são condições suficientes, mas necessárias ao sucesso. Repito: espero que o exemplo de Hélio Dourado não seja "cremado", porque nenhum clube se impõe por tradição, folclore e carteiraço, mas pelo trabalho duro de gente de carne e osso com talento, competência e conhecimento do que os mestres fizeram. O Grêmio volta a ganhar gauchão mas não basta, precisa mais; o Grêmio tem bom estádio mas não basta e o aumenta. Dourado não gostava da Arena por algum tempo, mas reconhecia sempre que o nosso inesquecível Olímpico, se fosse mantido, deveria passar por uma profunda reforma. Essa filosofia deve sempre se manter, porque o cerne disso, a ambição por ser mais do que já é, não pode virar cinzas.

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  2. Rodrigo
    a) Esse nepotismo é um dos maiores males em qualquer instituição, a situação se agrava, quando eles se veem cercados por "satélites" que não conhecem minimamente o futebol, a sua forma de gerir. Os preceitos e conceitos que norteiam uma instituição são os mesmos, então, conhecer o "processo fabril" é imprescindível, no caso, não conhecer futebol é suicídio
    b) Dourado foi o único a negar o apoio quando era importante negar ao Obino e depois, estendeu a mão em nome do Tricolor. Um exemplo de amor ao clube.
    c) Dourado tinha projeto para o rejuvenescimento do Olímpico

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  3. Talvez seu apoio (posterior, ao incompetente Obino) seja a maior demostração de sua personalidade e amor ao Grêmio, além de tudo que já foi falado.
    Creio que faltam mais Dourados.

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  4. Verdade, Arih
    Dourado ao abraçar a gestão Obino no segundo ano, 2004, foi para o sacrifício, foi para o matadouro; expôs a sua biografia pelo amor ao clube.

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