Pequenas Histórias (281) - Ano - 1954 - 2013
O Quereres da Infância
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Fonte: https://www.tripadvisor.com.br/ |
Na segunda metade da década de
60, eu, em plena infância, via o meu time ganhar sempre o campeonato
gaúcho, 66, 67, 68; penta, hexa, hepta, com isso, aumentou a minha admiração pelos
ídolos tricolores e pela casa onde davam memoráveis espetáculos.
Uma hora, eu queria ser o
goleiro Alberto; seleção brasileira, emérito pegador de penalidades, que brigava por uma vaga à Copa de 1970; noutra, queria ser o capitão Áureo, grande líder,
têmpera de campeão, exemplo de vencedor. Também, queria ser Everaldo, o mais
qualificado do time, mais que passista, ele era o mestre-sala que desfilava a
sua exuberância técnica nas laterais e no meio de campo; aliás, neste setor, queria ser Sérgio
Lopes, o camisa 10, o “Fita Métrica”, apelidado assim pelos lançamentos
certeiros para os atacantes. O engenheiro do Expresso da Vitória.
Otimista e presunçoso, eu queria ser
de todos eles, aquele que ocupava o lugar de luxo: o comando do ataque. Queria ser o Bugre, camisa 9, Alcindo, um centroavante, cujo suor, suas gotas, transpiravam gols, muitos gols; tantos que disputou a Copa do Mundo de 1966,
fazendo parceria com Pelé, porém, a bagunça administrativa do Selecionado impediu o
tri campeonato naquela edição.
Com a vocação irrefreável para
balançar as redes das mais variadas formas (pé esquerdo, direito, de
cabeça, batendo faltas, cobrando pênaltis), Alcindo virou o maior goleador da história Tricolor.
Vieram os vacilos das gestões seguintes, aí, o
Tricolor foi cedendo terreno para o Coirmão; jogadores envelheceram, perderam o
viço, outros, o brilho; e vi, com tristeza, a saída de Alcindo para o Santos
nos primeiros anos de 70. Do Peixe para o México, o retorno às origens, no ano da graça de
1977, ele, pensando em parar, voltou a Porto Alegre, começando a treinar no
Olímpico, sem compromisso, apenas para manter a forma. A notícia correu e a
massa exigiu uma chance para o veterano ídolo, já próximo dos 32 anos.
Telê acolheu o pedido dos
torcedores e deu oportunidade para o Bugre. Sua reestreia se deu diante do San
Lorenzo de Almagro no dia 23 de Março, amistoso acordado para quitar a negociação que
trouxe Ortiz para o Imortal no ano anterior. Alcindo fez o que sabia, gol,
aliás, gol de falta em La Volpe, que assim como Ortiz, na Copa da Argentina
(1978), levantaria a taça para os Hermanos. 1 a 0.
No mês seguinte, o primeiro clássico e adivinhem? 3 a 0, dois de Tadeu e um do Bugre; de cabeça.
Na quebra da hegemonia vermelha, o famoso 1 a 0, de 25 de Setembro, quem substituiu André, o centroavante do voo dramático do mal sucedido salto mortal? Ele mesmo, Alcindo. Botou faixa e deu volta olímpica como nos velhos tempos.
O Bugre, ele, o que eu queria ser, mas pensando bem, o verdadeiro quereres daqueles tenros anos era pisar no sagrado gramado do Olímpico ao lado deles; de Alberto, de Áureo, de Everaldo, de Sérgio Lopes e de Alcindo. Lá, em fila indiana, esperando para ser o último no túnel; me agachar e tocar levemente a grama, fazer o sinal da cruz, acenar para a massa, ouvir meu nome gritado, olhar e quase cegar pela potência dos refletores e me perfilar para acompanhar o hino riograndense executado pela banda da Brigada Militar, quem sabe, posar para a tradicional foto em pé, com os braços cruzados ou, talvez, agachado com a mão na bola, olhando para os flashes da ação dos fotógrafos ou vislumbrar no alto da marquise, ao fundo do monumental casarão da Azenha, a frase: nada pode ser maior.
Hoje, 17 de Fevereiro de 2023, 10 anos do último encontro feérico com o nosso Olímpico Monumental. Uma saudade imensa.
O verdadeiro Imortal no coração e mente da Nação Tricolor.
Quereres: "o querer é um impulso vivenciado emocionalmente. Nossas necessidades são apenas humanas, mas nossos quereres são essencialmente nossos."
Fonte: Arquivo pessoal do amigo Alvirubro
Zero Hora
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